quinta-feira, 3 de outubro de 2013

O cachorrinho da estação Quitaúna

Eu sempre brinquei com cachorros de rua, nunca tive preconceito ou medo de ser mordida (o que é um erro), pelo contrário, eu queria trazer mais alegria à vida dos pobres animais que moram na rua, passam frio, fome, sede, não tem uma cama para dormir, um dono para afagá-lo todos os dias. Na estação Quitaúna há vários cachorros, o que mais brinca comigo é um cachorro bege com pelo grande e enrolado de porte médio que, numa oportunidade, quase pulou para dentro do carro. Mas ele não era o único: são cerca de 5 cachorros que ficam naquela região, todos muito dóceis e carinhosos, todos alegres que vivem brincando e rolando no canteiro ao lado da porta da estação. Nessa semana o número caiu de uma forma horrível.

Eu estava indo à faculdade nesta terça, feliz com a vitória do Schalke e o golaço do Draxler, com a cabeça em ordem para fazer a última prova desse bimestre. Desci do carro e segui meu caminho para a estação. Vi um dos meus amiguinhos deitados na calçada, no caminho, fui em direção a ele, vi que tinha rastro de sangue saindo da boca. Respirei fundo e cheguei mais perto e vi que tinha uma estaca fincada no pescoço do cachorrinho. Eu não lembro qual foi a minha reação exata, só sei que tentei pegar o celular do bolso e não consegui, eu tentava falar e também não conseguia. Minha sorte foi que minha mãe ainda estava na avenida e me viu desnorteada no meio da rua e parou o carro. Cheguei até a porta, ela abaixou o vidro e eu chorei. Chorei por ter perdido um amigo, por ter visto essa cena horrível, por conseguir sentir a dor e a agonia que ele sentiu até morrer. Como um ser humano faz isso com um animal? Minha vontade era descobrir o desgraçado que fez isso e torturá-lo até a morte. Não era exagero, era o mais sincero e verdadeiro sentimento no momento. Recebi carona até a porta da estação, eu sai do carro tremendo e chorando, segui o caminho inteiro até a faculdade dessa forma. Durante a prova, vinha a imagem do cachorrinho morto à cabeça. Ao sair da prova, estava quase arrastando o meu amigo do meio da prova para eu não ficar sozinha e lembrar disso. Na volta, eu passei pelo lugar onde ele estava e mais uma vez, comecei a chorar.

Ontem não voltei para casa e tinha a esperança que alguém tivesse recolhido o cachorro, mas passei pelo local por volta da meia noite e ele ainda estava lá, encostado na parede, como se fosse um pedaço de pano, um saco de lixo. Como se fosse nada. Mas ele era alguém, ELE ERA O MEU AMIGO!!!

Hoje, então, fiz algo que julgava impossível porque eu só choro em coisas assim. Mas eu queria e precisava fazer mais pelo meu amigo. Eu liguei para a zoonoses de Osasco pedindo para retirarem o corpo do bichinho. Ao falar a situação para a mulher, eu já senti meus olhos marejarem. Eu tive que ligar para a Prefeitura de Osasco porque a Zoonoses daqui não realiza a coleta. Depois eu tive que explicar toda a situação para o moço da recepção e nesse ponto as lágrimas já escorriam pelo rosto, mas mantive a voz firme. Ele me transferiu para o responsável, esse outro moço me informou que só realizavam a coleta dos animais em clínicas então eu perguntei "mas e esse cachorrinho?" e o moço pediu o endereço e falou que faria o possível, mas que não poderia dar certeza que retiraria. Foi ai que eu chorei, pedi desculpas por estar chorando e disse que ele era meu amiguinho, que não queria mais vê-lo naquela situação e que se eu pudesse fazer algo, eu faria, mas que não tinha psicológico para isso. Então ele me informou que iria retirar ainda hoje ou no mais tardar amanhã. Pela primeira vez, vi utilidade no meu choro. E agradeço de coração a esse funcionário da prefeitura que atendeu ao meu apelo e percebeu que eu não queria apenas "me livrar do corpo morto", mas que ele apenas tivesse um descanso digno.

Eu não pude fazer nada para salvar a vida do cachorrinho, mas dessa vez, com lágrimas ou não, fiz algo por ele. E me senti mais calma e com a alma tranquila. Espero que onde quer que ele esteja, ele saiba que teve pelo menos uma pessoa gostava muito dele e que fez o que estava em seu alcance para que pudesse descansar em paz. 

Sensação de dever cumprido apesar do peso no coração!